Eliane Stephan

22. Abril. 1953
Rio de Janeiro RJ

Entrevista realizada em março/2017.
Revisada em dezembro/2018.

Eliane Stephan nasceu no Rio de Janeiro. Antes de ingressar na primeira turma do curso de Comunicação Visual e Desenho Industrial da PUC-RJ, cursava Letras. Seu interesse pelo Design surgiu numa conversa, quando ouviu falar pela primeira vez na Bauhaus. Naquele instante decidiu que era o que gostaria de fazer. O pensamento funcional aplicado à criação e a maneira particular com a qual um designer aborda um problema, levando em conta o usuário final, a escala humana como medida para a criação de objetos, imagens e textos, as questões estéticas e os processos de produção – forma e função, forma e conteúdo, arte e técnica –, tudo isso a levou a se apaixonar pela área, a se identificar e a se dedicar ao design.

Em seu percurso profissional como designer, começou pelo escritório de Aloísio Magalhães e o PVDI, no Rio de Janeiro; passou dois anos pelo Grapus, grupo de artistas gráficos franceses, em Paris; pela Folha de S.Paulo, pela Editora Abril e pela Carta Editorial, em São Paulo, onde se estabeleceu e mantém, ainda hoje, o seu escritório.

“Aos poucos fui descobrindo e me identificando com o design editorial.”  Na Folha de S.Paulo, comandou vários redesenhos do jornal até sua forma atual. Em 1993 encomendou do typedesigner alemão Erik Spiekermann o desenho de uma tipografia personalizada para o jornal (ainda hoje em uso), empregando a tecnologia, então recente, para desenho de fontes. Foi a primeira experiência desse tipo num jornal de grande porte, não só no Brasil mas também no exterior, pelo menos entre os que faziam parte da Society of Newspaper Design, na época. A criação da Folha Serif por Spiekermann, em parceria com o holandês Lucas DeGroot, foi amplamente divulgada pelo jornal, com certeza estimulou a difusão do desenho de tipos no Brasil, e levou a novidade aos debates da SND.

Como é o seu processo criativo?

No design,  eu parto de uma demanda de trabalho . Começa com uma série de perguntas, anotações e esboços, que faço num caderno. Pesquiso tipografia, cor, linguagem gráfica, papel, formato, e só então desenho no computador. Normalmente a forma surge da própria coisa, mas a inspiração pode vir de qualquer lugar. Enquanto faço já penso em produção, em finalização, já faço com acabamento – acho que é um vício dos tempos do jornal e das revistas, quando você faz coisas que outras pessoas irão finalizar em prazos muito curtos.

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Quais são suas principais referências, na prática ou na teoria do design?

Na prática, além do próprio Aloísio Magalhães, os designers com quem trabalhei no escritório dele: o Joaquim Redig e o João Souza Leite; e as designers Ana Luisa Escorel e Evelyn Grumach. A Elianne Jobim, e sua cabeça brilhante e atenta, o Rico Lins, me fez ver o design com outros olhos. Depois, com certeza, o impacto que foi conviver com o Pierre Bernard, do Grapus. E o Erik Spiekermann e o Lucas DeGroot, com quem aprendi muita coisa de tipografia. E a artista Lenora de Barros.  

Sua linguagem gráfica se relaciona com o fato de você ser mulher?

Não saberia dizer se é uma coisa perceptível. Talvez.

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Você se considera feminista?

Acho que sou feminista nas minhas atitudes e escolhas, acho que depende muito de como você se coloca diante do mundo, da vida. Mas é cada vez mais importante, principalmente junto às populações mais carentes, muitas vezes a mulher nem sabe dos seus direitos, sofre todo tipo de abuso. É importante, nesse sentido, que o feminismo seja reafirmado o tempo todo. Acho que a pobreza e a ignorância aumentam os problemas de gênero. Daí a necessidade de um feminismo mais radical.

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Você queria ter o seu trabalho reconhecido desde o começo?

Eu não tinha ideia, não pensava nisso. Para falar a verdade, nem sei o quanto é reconhecido. Ou por quem. Eu me formei nos anos 70, tinha muito menos gente fazendo design. Sei que fiz trabalhos importantes, que fizeram diferença, que ajudaram a divulgar o design e influenciaram outros designers, em determinado período. Mas nos últimos 15 anos as escolas de design se multiplicaram, os número de profissionais também, tem muitos designers excelentes no mercado, com o trabalho mais ou menos reconhecido.

É importante não confundir com fama, nem com os likes e dislikes.Cada vez mais vejo o meu trabalho em design como um trabalho coletivo, sempre multidisciplinar, um trabalho em equipe.

No início, eu queria fazer uma coisa que eu gostasse, que me desse autonomia e independência financeira, e que me desse prazer. Queria experimentar. As coisas foram acontecendo sem que eu me desse conta. Quando o trabalho é bem feito, você acaba sendo reconhecido.

Você tem consciência do seu lugar social quando realiza o seu trabalho? Busca algum tipo de militância através do design?

Sim, tenho consciência, sempre penso como meu trabalho irá chegar do lado de lá – no usuário, no leitor, no público. Eu penso o tempo todo em uso. Quem vai usar, quem vai ler, e como posso fazer o melhor para esse outro.

Não faço militância, política, se é essa a pergunta. Mas creio que o design, em si, pode ser militância. É uma profissão que já nasce preocupada com o humano, em atender a certos critérios de uso, como a arquitetura, o design é medido em escala humana – independente de classe social, raça, religião etc.. Não são apenas aspectos técnicos, mas afetivos, lúdicos, pode e deve divertir, agradar, emocionar. Fica entre a subjetividade e a objetividade.

O problema se coloca quando o design manipula, quando cria necessidades, ou o desperdício calculado, quando só pensa no lucro, quando engana as pessoas. É incrível que exista, mas existe. E é triste que exista.

O design produz muito lixo. Você se dá conta de quanto de plástico descarta num dia, só você, uma pessoa? Um design mais consciente seria muito bem vindo. Mas não termos políticas públicas para pensar em como lidar com lixo, por exemplo, ou como evitar a piora da contaminação das águas, é grave. Num país como o Brasil, cheio de sol e áreas extensas de terra, não termos energia limpa, é inadmissível. Se investe muito pouco em pesquisas tecnológicas, em pesquisas de materiais, na busca de qualidade do meio ambiente. Por exemplo, em embalagens menos poluentes. Outro dia li que é possível e já se fabrica plástico vegetal que se desfaz, vira compostagem, em 6 meses. Mas nada disso parece estar na agenda dos governos no Brasil. Justificam que ainda é caro. Bom, limpar o planeta vai sair muito mais caro, porque impossível.